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Foto do escritorantvaladas

Albergue

Durante a minha Volta à Europa à boleia conheci jovens de todo o mundo nas Pousadas de Juventude onde fui ficando. Conversávamos e na altura de cada um seguir o seu caminho eu convidava-os sempre para virem a Portugal e dava-lhes a minha morada.

Ora acontece que muitos levaram o convite a sério e apareceram mesmo!


Mas antes já tinha começado a transformar a casa dos meus pais num Albergue de Juventude.

Comecei logo no meu regresso a casa depois de um ano longe da família. No comboio que me trouxe de Irun até Lisboa conheci um indonésio da minha idade que vinha para Lisboa. Claro que conversámos imenso e a meio da viagem eu já o estava a convidar para ficar em minha casa.

Resultado, ao chegar a Santa Apolónia e cair nos braços dos meus pais, que não me viam há um ano, eu trazia comigo um brinde, o Supandi.


Claro que apanhei os meus pais completamente de surpresa. Queriam estar comigo, perguntar-me tudo e eu trazia-lhes um extra com que eles nunca teriam contado. Claro que as saudades eram tantas que mesmo que eu tivesse trazido comigo um elefante bebé eles teriam aceitado.

O rapaz ficou uns dias em nossa casa e depois foi à sua vida. Nunca mais soube dele.


Entretanto, os meus pais sentiam-se na obrigação de também receber um jovem americano na nossa casa. Havia um programa de Verão de dois meses e no Verão seguinte tive um irmão americano, o John. Era do Oregon e bom rapaz. Demo-nos bem. Também acabei por perder o contacto com ele.

Mas voltemos à volta à Europa. A romaria até à nossa casa começou no verão a seguir ao da volta.

Um dia estávamos a almoçar e a empregada veio dizer que estava um estrangeiro ao portão que perguntava por mim. Nunca mais tinha pensado nos meus convites pelo que fui ver o que se passava. Era um dos meus conhecidos do ano anterior. Disse-lhe para entrar e perguntei logo aos meus pais se ele podia lá ficar. O meu irmão já não vivia lá, pelo que havia um quarto livre. E ficou.


Bom, isto foi apenas o abrir da torneira. A partir dessa altura apareceram vários que acabavam sempre por ficar, um dia ou dois, no máximo. A empregada já sabia. Quando via um maltrapilho sujo, com barba e normalmente mau aspeto já nem perguntava, mandava-os logo entrar.


Os amigos dos meus pais, quando souberam desta nova atividade lá em casa metiam-se imenso com eles. O meu pai só dizia: qualquer dia instalo umas tendas no jardim para os amigos do meu filho.

E a mim perguntava: E ainda faltam muitos? Os teus amigos chegam cá a casa esfomeados e além disso trazem a roupa toda suja que a tua mãe insiste em lavar.

Enfim, foi só nesse ano, felizmente.


Mas ainda não íamos ficar por aí.

Certo dia uma amiga telefonou-me e perguntou se me importava de ficar com um alemão lá em casa. Um alemão? Mas quem era ele? Ela explicou.


Quando estivera em Londres para o concurso de Miss Mundo, ela tinha sido Miss Portugal, estivera num hotel onde todas as concorrentes ficavam hospedadas. Um jovem que trabalhava na recepção tinha ficado apaixonadíssimo por ela e truca. Metera-se num avião e aparecera-lhe à porta a dizer que queria casar com ela.

“E tu, queres casar com ele?” Perguntei divertido. “Não! Sabes que namoro com o ….., (um ator conhecido na época). Se ele sabe do alemão é o fim!”


Disse-lhe que lhe desse a minha morada que eu resolvia o problema. E lá me apareceu o “alemão apaixonado” que foi a alcunha com que ele ficou lá em casa. O desgraçado estava mesmo tomado. Andava pelos cantos e às vezes dava com ele a chorar, o que ficava muito mal num matulão que tinha quase mais um palmo de altura que eu. Com muito trabalho e paciência lá consegui que ele percebesse que a T…. não ia mesmo casar com ele e que o melhor que tinha a fazer era ir-se embora. E lá foi.

Mas ele tinha mesmo um fraco pelas portuguesas porque uns dois anos mais tarde oiço buzinar ao portão e aí estava ele num carro conduzido por uma rapariga. Era outra hóspede do hotel que ele tinha conhecido e por quem se tinha apaixonado. Mas vinha só desafiar-me para dar uma volta com eles. Desta vez já não ficou lá em casa.

Ainda em casa dos meus pais lembro-me só de mais uma situação em que enchi a casa, aliás, o jardim, de gente. Foi no final do meu serviço militar na Força Aérea. Em Monsanto havia um pelotão da Polícia Aérea. Eram muito novos, nem sei como é que os aceitavam e havia apenas soldados e cabos. Faltava-lhes quem os comandasse nas inúmeras paradas que tínhamos naquele quartel.

Tinham feito a recruta em Tancos, com os paraquedistas, e marchavam como eles. Ora o único oficial que tinha estado em Tancos e sabia marchar assim era eu. E fui designado seu comandante.


Estabelecemos uma relação ótima. Tudo o que precisavam era comigo que vinham ter. Poucos dias antes de terminar o meu serviço militar decidi convidá-los para um lanche em casa dos meus pais. O jardim era grande e eu ia fazer aqueles hamburgers que tinha aprendido a fazer na América. Em Portugal estávamos ainda longe de ter o primeiro McDonald’s.

Claro que adoraram e achei piada que à saída não sabiam se haviam de fazer a continência ou apertar-me a mão.


No meio de tudo isto há uma coisa que tenho que dizer: Os meus pais tinham de facto muita paciência!


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